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terça-feira, janeiro 22, 2013

História do Mali é marcada por conflitos separatistas desde o início do século XX


Da colonização francesa até a guerra na Líbia, 
conflitos do passado ajudam a explicar crise atual


O mundo passou a olhar com mais atenção para o Mali desde o dia 11 de janeiro, quando o presidente francês, François Hollande, anunciou a entrada da França no conflito interno do país africano após um apelo de emergência feito pelo presidente Dioncounda Traoré.

No entanto, o conflito tem implicações que datam desde o início da colonização francesa, em 1890. Passa por uma série de rebeliões separatistas provocadas pela população tuaregue no início do século XX, envolve a guerra civil líbia em 2011 e enfim desemboca no atual conflito, iniciado em janeiro de 2012.

Leia abaixo o resumo dos fatos históricos que contribuíram para o quadro atual.

Sudão francês

A colonização francesa sobre o território do atual Mali começou em 1880, tornando-se oficial dez anos depois (1890). Até 1959, foi recortado administrativamente por diversas vezes, passando a receber nomes como “Sudão Francês” (por duas vezes) e “Alto Senegal e Níger”.

Os gritos pela independência ficaram mais fortes a partir do sim da II Guerra Mundial (1945), quando foi iniciado o processo de descolonização do continente. A independência foi finalmente conquistada em janeiro de 1959, com um território federalista chamado Federação do Mali (do qual também faziam parte Senegal, Dahomey (atual Benin) e Alto Volta (atual Burkina Faso). Porém, dois meses depois a iniciativa foi esfacelada, restando apenas Senegal e Mali. Desconfianças militares acabaram por separar os dois definitivamente no ano seguinte. Assim, o Mali passou a adotar o nome, bandeira e território atuais.

Após a independência, sob o comando de Modibo Keita o país teve oito anos de um regime socialista com partido único e fortes laços com a União Soviética. As tentativas de forma agrária do governo socialista geraram revolta nas tribos tuaregues no norte, que não queriam ceder terras para um governo do qual alegavam não terem sido convidados para fazer parte. Após sangrenta repressão, acabaram derrotados em 1964.

Em 1968, Keita caiu após um golpe de Estado militar organizado por Moussa Traoré. Esse período foi marcado por opressão e instabilidade política, sucessivas tentativas de golpe de Estado, uma forte seca (1968-1974), revoltas estudantis em todo o país e crescente insatisfação na região norte do país.

O Mali passou por um processo de abertura política na última década do século XX. Os tuaregues do país e do Níger (onde ainda são mais populosos, cerca de 800 mil) tentaram novamente levantes esporádicos, mas volumosos, pela independência de 1990 a 1995. Uma das reclamações dos insurgente era de que eles não tinham acesso a altos postos no Exército. Por fim, um quarto levante entre 2006 e 2008 acabou após novo tratado de paz. Mas essa rebelião ficou marcada pela interrupção da produção de ouro nas montanhas do Níger. Mali e o vizinho Níger acusaram a Líbia de financiar os insurgentes.

Muitos dos atuais insurgentes do MNLA (Movimento Nacional de Libertação de Azawad – nome do território dado ao norte do Mali) lutaram nos dois lados na guerra civil da Líbia em 2011, que terminou com a queda do regime do coronel Muamar Kadafi (1969-2011). Os rebeldes voltaram ao Mali desempregados mas fortemente armados. Oficialmente, o grupo se formou em 23 de outubro de 2011, três dias após a morte de Kadafi.

O conflito atual

De janeiro a abril de 2012, forças separatistas tuaregues comandadas pelo MNLA começaram a atacar as bases militares no norte do país, principalmente nas regiões de Gao, Kidal e Timbuctu. Eles ganharam muito terreno em março, chegando a conquistar cidades sem enfrentar qualquer oposição do governo, afundado em uma crise política.

No dia 22 de março, um grupo de militares comandados pelo capitão Amadou Haya Sanogo depõe o presidente Amado Tumani Touré, alegando “incapacidade” do chefe de Estado em administrar o conflito que se acentuava. O golpe foi condenado pelo Conselho de Segurança da ONU, a União Africana e a Cedeao (Comunidade Econômica dos Estados da África Ocidental). Em 6 de abril, após negociações com os países vizinhos, foi acordado que o país seria governado interinamente por Diounconda Traoré. 

No dia 1º de abril, o MNLA, com a ajuda dos grupos religiosos do Ansar Dine (Defensores da Fé), AQIM (sigla em inglês da Al Qaeda no Magre islâmico) e Mujao (Movimento pela Unidade e Jihad na África Ocidental), tomam finalmente o controle de todo o norte malinês. O primeiro grupo proclama a independência do estado de Azawad seis dias depois, o que é condenado pelo governo de Bamako e pela UA (União Africana). Nenhum outro país reconhece a separação.

Conflitos na aliança insurgente

Em 6 de junho, na cidade de Gao (leste do Mali), a população se manifesta nas ruas contra a imposição da sharia e é violentamente reprimida pelo Ansar Dine. Dois dias depois, militantes das duas milícias entram em confronto armado na cidade, que resulta em duas mortes. Depois de tentativas fracassadas de fusão, ocorre o rompimento definitivo dos dois grupos.

No dia 20 do mesmo mês, o Ansar Dine afirma ser contra a independência de Azawad, e que o objetivo do grupo é a imposição da sharia em todo o Mali. Os confrontos entre os separatistas e os fundamentalistas só se intensificam: em julho, o MNLA perde controle de Gao, Kidal e Timbuctu. O norte do Mali ficou sob o controle da coalizão islâmica.

Em Timbuctu, documentos medievais e construções consideradas patrimônio da humanidade pelas Nações Unidas foram vandalizados. Nas cidades tomadas, a música regional malinesa também foi interditada.

Em outubro, o MNLA retoma controle da cidade de Ménaka, que sofre um grande afluxo de pessoas fugindo das cidades sob controle da coalizão islâmica.

No dia 12 de outubro, o Conselho de Segurança aprovou, por unanimidade, uma resolução proposta pela França para auxiliar o exército malinês e preparar uma intervenção militar que seria organizada por UA e Cedeao, mas ainda sem o envio de tropas, apenas a apresentação de um plano em 45 dias. No mesmo mês, parte de Ménaka foi tomada pela coalizão islâmica. Em Bamako, manifestantes marcham nas ruas pedindo intervenção internacional.

Já em 8 de janeiro, segunda a Al Jazeera, 12 tropas do governo foram capturadas pelos rebeldes na cidade estratégica de Konna, centro do país (700 quilômetros de Bamako). Dois dias depois, a cidade é tomada, o que poderia significar o primeiro passo para o avanço em direção a Bamako. Um grupo de cerca de 1.200 rebeldes avança em direção ao oeste e se aproxima de Mopti.

Durante esse período, Traouré apela ajuda emergencial a Hollande, que no dia seguinte, anuncia a entrada na França no conflito através da Operação Serval. Nos primeiros dias, a ofensiva se concentrou em ataques aéreos, a maioria deles partindo do Chade, ao leste. A intervenção, inesperada, obteve apoio da ONU, União Europeia, União Africana, Cedeao e MNLA.

A Operação Serval já levou ao menos 800 oficiais franceses ao país. Nas próximas semanas, estima-se que o número de tropas francesas no país deve chegar a 1,7 mil, totalizando 2,5 mil oficiais. Entre os dias 12 e 15 de janeiro e nesta quinta (17/01), jatos franceses bombardearam diversas cidades de controle rebelde entre a região norte e o sudoeste do Mali.

Em um congresso realizado por seus líderes, o MNLA adverte o exército malinês para não ultrapassar as fronteiras do que eles consideram sua pátria, mas afirmam que gostariam de negociar futuramente essa questão de forma diplomática com o Mali e a Cedeao. No entanto, só resta aos separatistas o controle de algumas áreas rurais, próximas às fronteiras com Argélia, Mauritânia e Níger.

Na madrugada do sexto dia de intervenção, as tropas francesas, em conjunto com as malinesas, iniciaram as operações e os combates terrestres. Os oficiais contam com tanques e equipamentos típicos do combate de guerra. As tropas terrestres se concentraram nos primeiros dias em cidades controladas pelo governo e próximas dos postos rebeldes

Em uma semana, a ofensiva obteve progressos significantes. Em 18 de janeiro, após dias de batalhas e informações desencontradas, foi confirmada a retomada de Konna pelas tropas do governo, além de Diabali (400 quilômetros de Bamako), tomada por rebeldes cinco dias antes. Um dia antes, foi registrado, em Londres, o primeiro protesto contra a intervenção francesa: um grupo de 60 pessoas em frente à embaixada exigia a retirada das tropas de intervenção sob cartazes de que “a sharia era a única solução para o Mali”.

Crise humanitária

Com a intensificação do conflito, a crise humanitária no país africano se agravou. Segundo estimativas da ACNUR (Agência de Refugiados das Nações Unidas), a crise no Mali deve provocar a fuga de mais de 400 mil pessoas para os países vizinhos e de, pelo menos, 300 mil internamente.

Em alguns países vizinhos ao Mali, foram instalados campos provisórios para abrigar os refugiados. Ao mesmo tempo, a agência da ONU tenta ajudar os que procuram abrigo fora de seu país, enviando especialistas para a região com o objetivo de apoiar a assistência aos refugiados.

FONTE: OPERA MUNDI

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